Crise energética na China: Entenda por que os apagões são uma ameaça à economia mundial

30-09-2021 | Energia, Notícias

A crise de energia na China está interrompendo a atividade de fábricas, gerando desafios para as cadeias de suprimento de tecnologia e adicionando riscos ao crescimento econômico do país, que já enfrenta a incerteza dos esforços do governo para esfriar o setor imobiliário.

Os cortes de energia são o resultado de uma soma de vários fatores, desde a alta nos preços das commodities energéticas e a recuperação pós-covid-19 até os compromissos ambientais assumidos pelo presidente Xi Jinping.

Entenda o que está acontecendo sobre a crise energética da China através destas cinco perguntas:

1. Por que está ocorrendo racionamento de energia na China?
2. Quem está sendo afetado pela crise na China?
3. O que a crise significa para a cadeia de abastecimento global?
4. Quanto tempo vai durar a crise?
5. Como isso afeta a economia chinesa?

1. Por que está ocorrendo racionamento de energia na China?

Xi prometeu que as emissões de carbono da China atingirão o pico antes de 2030 e que o país alcançará a neutralidade de carbono em 2060. Isso implica em uma grande mudança em um país onde mais da metade de toda a energia é gerada a partir do carvão — e as autoridades estão levando as metas ambientais a sério.

Em agosto, o principal órgão de planejamento econômico da China, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma (NDRC, na sigla em inglês), questionou as províncias — entre elas Jiangsu, Guangdong e Hubei, importantes centros industriais — por não cumprirem as metas de intensidade energética para o primeiro semestre de 2021.

Intensidade energética representa o uso de energia por unidade de produção econômica. Posteriormente, as autoridades locais enviaram avisos às empresas exigindo que cortassem o consumo de energia.

Mas há mais coisas acontecendo. Também houve escassez de energia devido aos altos preços do carvão e do gás natural, que dispararam nas últimas semanas. As altas temperaturas em áreas como Guangdong, assim como a recuperação em curso após a crise pandêmica, geraram uma alta demanda de eletricidade.

Como os preços da energia são regulados, as usinas perderiam mais de 0,15 yuans por quilowatt-hora de energia gerada com os preços atuais dos combustíveis, de acordo com Alex Whitworth, da empresa de pesquisa Wood Mackenzie.

“Há pouco incentivo [para as usinas] comprarem mais combustível no mercado à vista porque os custos não podem ser
repassados aos consumidores”, disse ele.

2. Quem está sendo afetado pela crise na China?

Apagões programados e restrições ao uso de eletricidade já foram relatados em pelo menos 20 províncias e regiões chinesas. Na província de Jiangsu, centro tecnológico da China, alguns fabricantes foram orientados em reduzir seu consumo até o final de setembro em 10% a 30% dos níveis usuais, disseram fontes ao “Nikkei Asia”. Algumas empresas, porém, receberam no último domingo um pedido para interromper totalmente o uso de eletricidade até o final do mês.

Em Guangdong, um centro para fabricantes de automóveis e eletrônicos, pelo menos 180 empresas japonesas estão sendo afetadas pelas restrições, de acordo com Rintaro Tanaka, da Organização de Comércio Exterior do Japão. Desde meados de setembro, essas companhias foram orientadas a interromper ou reduzir o consumo de eletricidade em até cinco dias por semana, disse ele.

Cortes de energia também foram programados em áreas de Pequim e Xangai até domingo, afetando principalmente zonas residenciais

3. O que a crise significa para a cadeia de abastecimento global?

Entre as empresas afetadas estão fornecedores essenciais para players globais, como Apple, Tesla e Microsoft. Muitos estão contando com os estoques para manter a fabricação e os embarques nesta semana. Alguns esperam recuperar as perdas na produção durante a chamada “Golden Week”, um feriado prolongado que começa na sexta-feira.

No entanto, se as restrições persistirem em outubro, as empresas temem que possa haver impactos significativos em uma série de setores, já que os problemas em um elo da cadeia de abastecimento afetam rapidamente os demais. A fabricante de componentes hidráulicos Hengli Hydraulic, por exemplo, disse a analistas do Citi que não estava tendo que lidar com os cortes de energia, mas temia que seus clientes pudessem ser afetados.

4. Quanto tempo vai durar a crise?

Tanaka, da Organização de Comércio Exterior do Japão, espera que a crise de energia continue até o final de outubro ou até mesmo o início de novembro. “[As restrições à produção] serão afrouxadas, mas a oferta [de energia] não mudará”, disse ele.
Outros preveem que pode ser ainda mais longa. “É provável que a crise de energia na China persista até o final de 2021, já que os governos locais estão sob pressão para cumprir metas de redução de emissões para este ano”, disse Zhu Chaoping, estrategista de mercado global da J.P. Morgan Asset Management.

A situação dependeria dos preços dos combustíveis e da política do governo, segundo Whitworth, da Wood Mackenzie. O crescimento da demanda de energia deve desacelerar na segunda metade do ano, mas os preços dos combustíveis “podem permanecer elevados no inverno [no hemisfério norte] e talvez por mais tempo”, disse ele. A solução poderia ser um alívio da pressão financeira sobre as usinas de carvão e gás, com um aumento das tarifas por parte do governo.

Não há garantia de que o racionamento atual seja um evento único. O NDRC da China anunciou uma política em setembro que indicava que o país acompanhará de perto o consumo de energia, explicou Ting Wang, gerente do Instituto de Pesquisa do Japão. “Pode haver situações semelhantes no futuro”, disse ela.

5. Como isso afeta a economia chinesa?

Dados recentes mostraram vendas decepcionantes no varejo e fraqueza no mercado imobiliário, setor em que o governo está tentando reduzir o endividamento de megaincorporadoras como a Evergrande e esfriar a especulação. Com isso, os
economistas já estavam em alerta para uma desaceleração. Agora, eles estão rebaixando suas previsões.

Na sexta-feira passada, o Nomura rebaixou sua previsão de crescimento para o PIB chinês de 8,2% para 7,7% em 2021, citando eventuais choques nas cadeias de abastecimento devido à crise energética. O Goldman Sachs fez o mesmo na terceira e reduziu sua estimativa de expansão da economia chinesa no terceiro trimestre, em relação aos três meses anteriores, de 1,3% para 0%.

Fonte: Valor Econômico

Foto: Tomohiro Ohsumi/Bloomberg

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